Meses atrás, fui contratado por uma empresa para tomar conta de um grupo de pessoas que precisavam de acompanhamento para desenvolverem suas tarefas com mais assertividade. Após alguns encontros com o grupo, percebi que duas dessas pessoas se destacavam entre as outras. Todas as vezes que terminavam as reuniões, elas começavam a arrumar as cadeiras, pegavam vassouras e varriam o local, deixando tudo limpo como antes.
Aquelas meninas não precisavam fazer aquele trabalho, mas faziam. Foi aí que me lembrei dos japoneses quando vieram ao Brasil para a Copa do Mundo de Futebol. Eles viraram notícia por, após cada jogo, limparem o local das arquibancadas onde ficavam. E elas faziam o mesmo naquela cidade do sertão pernambucano.
Dias após ter visto aquela cena, encontrei-as novamente na reunião com o grupo. Já estava impactado com a imagem das duas. Mesmo durante as palestras, meus olhos sempre as buscavam onde estivessem. Naquela noite, por desígnio do destino, me demorei ao final em conversas, e elas estavam sem transporte para voltar a suas casas. Ofereci a “carona”, que foi aceita, e foi nesta noite que nossas vidas se juntaram e não mais se separaram enquanto eu desenvolvia meu trabalho na cidade.
Helena, sentou-se ao meu lado no carro. Seu perfume, uma mistura de jasmim e terra molhada, invadiu o espaço, trazendo uma sensação de conforto e familiaridade. Eduarda, ocupou o banco de trás, e sua voz suave preenchia o silêncio com histórias de infância e sonhos futuros. A estrada parecia se estender infinitamente, mas a companhia das duas tornava a viagem uma experiência quase mágica.
E assim, entre risos e lágrimas, fomos construindo uma narrativa de amozase e cumplicidade, marcada pela simplicidade e pela profundidade dos sentimentos que compartilhávamos. As Marias, com suas personalidades distintas, mas complementares, trouxeram à minha vida uma riqueza que eu jamais poderia ter imaginado. E, no fundo de minha alma, uma esperança tímida persistia: que o destino fosse generoso e permitisse que nossa história continuasse a ser escrita, dia após dia, com a mesma intensidade e beleza que a caracterizava.
Os dias foram passando e nos envolvemos completamente em nossa amizade. Eu já acordava com ligações ou mensagens delas. Às vezes para conversar, muitas vezes para as levar de um lado ao outro. O que eu fazia com amor. Afinal, eu estava amando as duas Marias.
O choque foi descobrir que elas eram casadas. Quase caí de costas quando soube. Mesmo assim, continuamos a nos encontrar. Com a convivência, fui ouvindo suas histórias, e elas vinham carregadas de sonhos de conseguirem um trabalho que as tirasse da dependência dos seus maridos. E fui percebendo que a distância deles estava prejudicando os sentimentos de cada uma. Já não havia mais amor, era só a convivência. Eu me pergunto diariamente como viver a dois sem compartilhar o sentimento de amar. E eu percebia nelas que a situação não era das melhores. Compartilhar os lençóis sem que haja qualquer desejo era uma tortura. E eu tive a certeza disso quando ouvi elas soltarem, sem querer, que não havia mais amor entre eles.
Certa tarde, após uma reunião, Helena me chamou para uma conversa. Sentamos em um banco de praça, sob a sombra de uma árvore frondosa. Ela começou a falar sobre seu marido, sobre a distância que os separava e sobre a solidão que sentia. Seus olhos, que sempre brilhavam com alegria, agora estavam opacos, refletindo a tristeza de um coração solitário.
— Eu não sei mais o que fazer — disse ela, com a voz embargada.— Sinto que estou presa a um casamento que já não existe. Ele está lá, em Minas, e eu aqui, sozinha, tentando encontrar um sentido para a minha vida.
Eu a ouvi em silêncio, sentindo a dor em cada palavra. Queria abraçá-la, confortá-la, mas sabia que isso só complicaria ainda mais as coisas. Em vez disso, segurei sua mão e prometi estar ao seu lado, como amigo, como confidente.
Naquela mesma noite, Eduarda me chamou para uma caminhada. Fomos até a beira do rio, onde o som da água corrente do Rio São Francisco criava uma melodia suave. Ela começou a falar sobre seus sonhos, sobre a vontade de estudar, de trabalhar, de ser independente. Seus olhos brilhavam com determinação, e eu podia ver a força que emanava dela.
— Eu quero ser livre — disse ela, com firmeza. — Quero poder tomar minhas próprias decisões, sem depender de ninguém.
Eu a admirei ainda mais naquele momento. Eduarda era uma mulher forte, decidida, que sabia o que queria da vida. E eu, mais uma vez, me vi dividido entre essas duas mulheres incríveis, cada uma com suas dores, seus sonhos, suas esperanças.
Os dias continuaram a passar, e nossa amizade se fortaleceu. Eu estava lá para elas, e elas estavam lá para mim. E, no fundo do meu coração, uma esperança tímida persistia: que o destino fosse generoso e permitisse que nossa história continuasse a ser escrita, dia após dia, com a mesma intensidade e beleza que a caracterizava.
A convivência com as Marias trouxe uma nova cor à minha vida. Cada dia era uma descoberta, um novo capítulo de uma história que parecia escrita pelas mãos do destino. Com o passar dos dias, nossa relação se aprofundou. As Marias se tornaram parte essencial da minha rotina. Helena, com seu sorriso contagiante, iluminava os momentos mais sombrios. Eduarda, com sua serenidade, trazia paz aos dias mais turbulentos. Juntos, formávamos um trio inseparável, unidos por laços que transcendiam o tempo e o espaço.
A cidade do sertão Sergipano, com suas paisagens áridas e céu infinito, cortada pelo Velho Chico, tornou-se o cenário de nossa história. Cada encontro, cada conversa, cada gesto, fortalecia o vínculo que nos unia. E assim, entre risos e lágrimas, fomos construindo uma narrativa de amor e cumplicidade, marcada pela simplicidade e pela profundidade dos sentimentos que compartilhávamos.
Certo dia, aproveitando uma folga do trabalho, fomos ao meu apartamento ver um filme na TV. Água, suco e um bocado de biscoitos nos acompanharam naquela tarde preguiçosa. Estávamos tão juntinhos que, em certo momento, nos encontramos abraçados uns aos outros. Naquele instante, senti o carinho delas, a amizade pulsando em cada toque.
Eduarda, com sua natureza reservada, encostou seu corpo no meu como quem busca proteção e carinho. Eu a abracei, e ela encostou a cabeça no meu ombro esquerdo. Ficamos juntos como bons amigos, mas o amor estava ali, silencioso, porém presente. Helena, por sua vez, estava abraçada por mim com o braço direito. Sempre mais arredia, era dela que exalava o amor mais intenso. Ela sempre teve medo do que sentia, mas naquele momento, deixou-se envolver pelo calor do nosso abraço.
A tarde foi passando, e o filme na TV tornou-se apenas um pano de fundo para a nossa proximidade. As risadas, os sussurros e os olhares cúmplices criavam uma atmosfera de intimidade que transcendia a amizade. Cada gesto, cada toque, parecia reforçar o laço invisível que nos unia.
Quando o sol começou a se pôr, a luz dourada invadiu a sala, criando sombras suaves que dançavam nas paredes. Eduarda, com seu sorriso tímido, olhou para mim e disse:
— Sabe, nunca me senti tão à vontade com alguém como me sinto com você.
Helena, ainda encostada no meu ombro, assentiu silenciosamente, seus olhos brilhando com uma mistura de emoções. Eu, tomado por um sentimento de gratidão e amor, apenas sorri e apertei-as mais forte contra mim.
Naquela noite, após elas terem ido embora, fiquei refletindo sobre o que estava acontecendo entre nós. O amor, esse sentimento incontrolável, havia nos envolvido de uma maneira que nenhum de nós poderia prever. E, embora soubéssemos das complicações e dos desafios que isso traria, estávamos dispostos a enfrentar tudo juntos.
Os dias seguintes foram uma mistura de alegria e incerteza. Continuamos a nos encontrar, a compartilhar momentos e a construir uma história que, embora complicada, era nossa. As Marias, com suas personalidades distintas, mas complementares, trouxeram à minha vida uma riqueza que eu jamais poderia ter imaginado.
E assim, entre risos e lágrimas, fomos construindo uma narrativa de amor e cumplicidade, marcada pela simplicidade e pela profundidade dos sentimentos que compartilhávamos. No fundo de minha alma, uma esperança tímida persistia: que o destino fosse generoso e permitisse que nossa história continuasse a ser escrita, dia após dia, com a mesma intensidade e beleza que a caracterizava.
Os dias continuaram a passar, e nossa amizade se transformou em algo mais profundo e complexo. O amor que sentíamos um pelo outro era inegável, mas também sabíamos que nossas vidas estavam entrelaçadas de maneiras que não podíamos simplesmente ignorar. As Marias, com suas histórias de vida e seus sonhos, tornaram-se parte essencial de quem eu era.
Certa noite, enquanto estávamos reunidos novamente em meu apartamento, Helena tomou a iniciativa de falar sobre o futuro. Seus olhos, sempre tão brilhantes, agora estavam sérios e determinados.
— Precisamos tomar uma decisão — disse ela, com a voz firme. — Não podemos continuar vivendo assim, entre a amizade e o amor, sem saber para onde estamos indo.
Eduarda, sempre mais introspectiva, assentiu em silêncio. Eu sabia que ela também estava pensando no que viria a seguir. O silêncio que se seguiu foi pesado, carregado de emoções não ditas.
Finalmente, tomei coragem para falar.
— Eu amo vocês duas — disse, com a voz embargada. — Mas sei que não podemos continuar assim para sempre. Precisamos encontrar uma maneira de seguir em frente, de sermos felizes, mesmo que isso signifique tomar caminhos diferentes.
Helena e Eduarda se entreolharam, e eu pude ver a dor e a compreensão em seus olhos. Sabíamos que o amor que compartilhávamos era real, mas também sabíamos que nossas vidas eram complicadas demais para que pudéssemos simplesmente ignorar as realidades que nos cercavam.
Decidimos, então, que era hora de seguir em frente. Helena, com sua força e determinação, decidiu mudar de postura e começou e me ignorar, já não olhava mais nos meus olhos, já não me abraçava como antes. Ela buscou ficar longe das nossas belas lembranças. Eduarda, com sua serenidade e coragem, decidiu voltar a estudar e buscar a independência que sempre sonhou.
O amor que compartilhamos nunca seria esquecido, mas sabíamos que era hora de seguir em frente e buscar a felicidade de outras maneiras.
O dia da minha partida chegou, e com ele, a tristeza de deixar para trás as duas Marias. Não houve tempo para despedidas adequadas, para abraços que transmitissem o calor de um carinho sincero, nem para olhares que pudessem eternizar aquele momento. As duas mulheres que tanto significavam para mim não estavam ao meu lado naquele instante crucial.
A viagem de volta para casa foi longa e solitária. As lágrimas, companheiras silenciosas, deslizavam por meu rosto, refletindo a dor de um coração partido. Cada quilômetro percorrido parecia aumentar a distância entre mim e os amores que deixei para trás.
No fundo de minha alma, uma esperança tímida persistia. Um dia, talvez, os caminhos da vida me levassem de volta às duas Marias que marcaram minha existência de maneira tão profunda. Até lá, carregaria comigo as lembranças dos momentos compartilhados, na esperança de que o destino fosse generoso e permitisse um reencontro.
Dimas Roque